A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a violência de uma forma abrangente como sendo o uso da força ou poder em ameaça ou na prática, contra si próprio, outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade que resulte ou possa resultar em sofrimento, morte, dano psicológico, desenvolvimento prejudicado ou privação.
O conceito de “violência”, cujo ato visa destruição e desconstrução, é antagônico ao conceito de “saúde” que representa a busca pela integridade do indivíduo. São conceitos antagônicos com pontos negativos de interseção. Desde 1996 a Assembleia Mundial da Saúde realizada em Genebra definiu, na sua resolução, que a violência constitui um importante problema de saúde pública
O atlas da violência de 2016, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSG), referente à análise da série histórica da violência no Brasil no período compreendido entre 2004 e 2014, concluiu que foi o Nordeste a região com maior escalada de homicídios. O Estado do Rio Grande do Norte apresentou um incremento de 308,1% sendo o maior entre os estados nordestinos. Decisões equivocadas foram tomadas e devemos refletir como cidadãos potiguares e brasileiros. Onde erramos?
Estatisticamente para cada morte violenta, provavelmente muitas internações, atendimentos em emergências e consultas médicas foram necessárias. Um ato de violência quase que invariavelmente produzirá um ato médico na assistência ao sobrevivente ou na emissão do laudo de necropsia. Portanto, o médico é testemunha chave da violência, incluindo aquela dita interpessoal resultante da insegurança pela qual atravessamos. Dados do Núcleo Hospitalar de Vigilância Epidemiológica do Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel revelam um incremento nos atendimentos a vítimas de violência entre 2016 e 2017. A média de atendimentos/mês de janeiro a junho de 2017 aumentou 19,35% em relação ao mesmo período do ano anterior. Nos seis primeiros meses de 2017, 36% dos óbitos registrados naquele hospital foram de vítimas de homicídio. A violência tem sido mais um fator responsável pela superlotação nos hospitais, com consequente comprometimento no abastecimento e na resolutividade dos pacientes críticos que permanecem em ambientes inadequados aguardando vaga no centro cirúrgico ou na UTI. Esse conjunto de fatores tem como consequência os maus resultados. Os médicos, assim como parte da sociedade, têm sido vítimas da violência inclusive nos ambientes de trabalho, considerados sagrados. A primeira Convenção de Genebra datada de 1864 criou a Cruz Vermelha e determinou o cuidado com os soldados feridos, respeitando as ambulâncias e hospitais que deveriam portar o símbolo da Cruz Vermelha com fundo branco. Teremos que adotar o símbolo da Cruz Vermelha em nossas unidades de saúde?
Recentemente as entidades médicas Academia de Medicina, Associação Médica, Sindicato dos Médicos e Conselho Regional de Medicina se uniram na campanha “Médicos contra a violência” que visa agregar os médicos, demais instituições e a sociedade civil organizada na busca por respostas e soluções no curto, médio e longo prazo. Experiências exitosas em outros estados como Paraná e Espírito Santo, implantadas a partir de 2011, devem ser avaliadas e se possível replicadas em nosso Estado. Somos unânimes em afirmar que a falta de educação pública de qualidade, com escolas em tempo integral para nossas crianças e adolescentes, permitiu que esses pequenos indivíduos enveredassem para a criminalidade. O poder público deve assumir imediatamente o cuidado com nossas crianças vulneráveis. Somente assim evitaremos a necessidade futura de utilizarmos o símbolo da Cruz Vermelha.
Dr. Marcos Lima de Freitas
Presidente do Conselho Regional de Medicina do RN
Aviso de Privacidade
Nós usamos cookies para melhorar sua experiência de navegação no portal. Ao utilizar o Portal Médico, você concorda com a política de monitoramento de cookies. Para ter mais informações sobre como isso é feito, acesse Política de cookies. Se você concorda, clique em ACEITO.