altImportantes questões relacionadas à assistência obstétrica foram discutidas no primeiro dia do I Encontro Nacional de Conselhos de Medicina – 2015, que teve início na manhã desta quarta-feira (4), em Belo Horizonte (MG). Em mais de cinco horas de exposições e debates, os participantes focaram na importância de assegurar o melhor atendimento, sempre com respeito à autonomia da paciente e do médico.

Na mesa coordenada pelos conselheiros José Hiram Gallo, diretor Tesoureiro do CFM, e Sidnei Ferreira, 2º secretário, por exemplo, foi colocada em perspectiva a Resolução Normativa nº 368, editada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que, entre outros pontos, determina às operadoras disponibilizar, quando for solicitado pelas pacientes, “o percentual de cirurgias cesáreas e de partos normais” praticado por médicos e serviços conveniados.

A regra ainda exige a oferta do Cartão da Gestante às beneficiárias dos planos de saúde e que os médicos preencham um partograma, em formato de gráficos, o qual deve ser apensado ao processo para pagamento do procedimento.

Na visão de Roberto Magliano de Morais, membro da Câmara Técnica de Ginecologia e Obstetrícia do CFM e um dos expositores, essa norma foi uma resposta apressada da ANS a uma determinação da Justiça, feita em agosto de 2014, de apresentar soluções para o alto número de cesáreas no País.


encm2015publicoFalta de estrutura – Para ele, a medida adotada não combate de fato o contexto que contribui para a quantidade de partos cirúrgicos no Brasil. “As maternidades brasileiras não têm estrutura para receber com conforto e segurança, parturientes e obstetras”, disse.

Magliano ressaltou que a Câmara Técnica do CFM entende que se deve envidar esforços para que as usuárias tenham total acesso às informações que possam lhes ser úteis na tomada de decisões em saúde, incluindo número de partos normais e cesáreas. Contudo, chamou a atenção para algumas inconsistências na Resolução da ANS.

Com respeito ao acesso às informações de médicos e hospitais, o palestrante apontou o risco do viés ou erro sistemático induzido pela ANS. “Se um obstetra realiza apenas uma cesárea para a operadora A e três partos normais para a operadora B, as informações sobre este profissional trarão uma taxa de 100% de cesarianas ou de 100% de partos normais, dependendo do plano consultado”, exemplificou.

Além disso, ele afirmou que hospitais e maternidades de baixo risco não podem ser comparados a centros de referência de alto risco, pois as cifras de cesariana e partos normais serão diferentes. “Informações imprecisas geram interpretações e decisões equivocadas quanto as estratégias para reduzir as taxas de parto cesariana no Brasil”, lembrou o palestrante.


Equívoco no partograma –
 Magliano considerou útil a instituição do cartão da gestante – registro das consultas de pré-natal, que deve permanecer com a paciente e ser apresentado em estabelecimentos de saúde, inclusive na maternidade. Este instrumento sempre foi defendido pelo CFM e pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), afirmou.

Contudo, considerou um equívoco condicionar a existência do partograma no prontuário das gestantes para o pagamento dos honorários médicos. “Essa normatização pode prejudicar a beneficiária que queira realizar cesárea a pedido, uma vez que, nessa situação, o pagamento do procedimento recairá sobre a paciente”, disse.

Na conclusão de sua palestra, o membro da Câmara Técnica ressaltou que é necessário refletir sobre a prática obstétrica no Brasil com a meta de reduzir o número de cesarianas. Mas, para isso, acrescentou: “o obstetra não pode ser constrangido em sua autonomia profissional, tendo a prerrogativa de se recusar a realizar ou não a cesariana a pedido, de acordo com os princípios da bioética e dos preceitos legais; e, no caso, de solicitação é recomendável esclarecer à gestante sobre riscos e benefícios da intervenção”.

Problema na origem – Na sequência, o presidente da Febrasgo, Etelvino Trindade, fez uma exposição sobre partos normal e cesárea e a disponibilidade obstétrica. Para ele, os problemas de percepção no que se refere ao parto têm origem no entendimento de que o parto é um evento puramente fisiológico e, por isso, isento de maiores complicações.

“Assim, a perda da mãe ou do filho representa para o leigo uma atuação médica desastrosa”. Sobre a escolha do tipo de parto a ser praticado, ele orienta o profissional a apresentar à gestante todos os riscos e benefícios do procedimento, buscando o pleno esclarecimento que possibilite à grávida tomar a decisão que julgar mais adequada, sendo que o obstetra também pode exercer o direito de sua autonomia e se recusar a realizar o procedimento, encaminhando a gestante para outro profissional, alertou.

 Etelvino abordou ainda aspectos do Parecer do CFM nº 39/12, o qual afirma que “é ético e não configura dupla cobrança o pagamento de honorário pela gestante referente ao acompanhamento presencial do trabalho de parto, desde que o obstetra não esteja de plantão e que este procedimento seja acordado com a gestante na primeira consulta. Tal circunstância não caracteriza lesão ao contrato estabelecido entre o profissional e a operadora de plano e seguro de saúde”.

Em sua fala, o presidente da Febrasgo sublinhou aspectos que devem ser observados no uso deste recurso, como a apresentação do médico à paciente de todo o detalhamento de sua cobertura pelo plano de saúde; o fato de que se houver opção pelo acompanhamento presencial no parto, o honorário do procedimento será pago por ela, diretamente ao obstetra; e a importância de registrar o acordo em Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

“O obstetra credenciado em Convênio ou Cooperativa Médica deve observar atentamente o seu contrato com a empresa, em relação à assistência ao parto, obedecendo às condições pré-estabelecidas. Caso o profissional entenda que a remuneração por essa assistência não lhe é conveniente, o melhor caminho é descredenciar-se. A negativa em fazer o parto por motivo de remuneração não atende às normas da ética médica, assim como cobrar valor suplementar diretamente da paciente”, pontuou.

Proposta no Congresso – Finalmente, o conselheiro Alceu Pimentel, da Comissão de Assuntos Políticos do CFM, fez uma explanação sobre o projeto de lei 7.633/2014, de autoria do deputado Jean Wyllis. O texto retomou sua tramitação na Câmara Federal a pedido de seu autor, após ter sido enviado para o arquivamento no fim da legislatura anterior.

O texto, que pretende introduzir um conjunto de regras, critérios e parâmetros na assistência obstétrica, foi analisado pelo expositor em função de seus objetivos e argumentação, confrontando-o com questões técnicas já contempladas em determinações do Ministério da Saúde e das sociedades de especialidades.

Todos os temas com compuseram a mesa inicial do I ENCM foram, na sequência, abordados em debate no qual os participantes expuseram suas críticas, sugestões e considerações. O engajamento na rodada de discussões valorizou ainda mais o Encontro, que, na abertura, contou com as saudações dos presidentes do Conselho Federal de Medicina, Carlos Vital, e do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG), Itagiba de Castro. Na oportunidade, ambos ressaltaram a relevância do evento para as lideranças e o futuro do movimento médico no Brasil.
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